quinta-feira, 12 de março de 2015

Esperando Pelo Rei

Em 3 de junho de 2014, foi publicado nos Estados Unidos o livro Remember The Time: Protecting Michael Jackson in His Final Days. Um relato de memórias de Bill Whitfield e Javon Beard, dois seguranças que trabalharam para o Rei do Pop durante dois anos e meio - entre dezembro de 2006 e junho de 2009. Engraçado, triste e trágico, conhecemos a intimidade do carinhoso pai Michael Jackson e a solitária rotina de seus anos finais. Nesta tradução exclusiva, confira um trecho do livro. Todos os direitos do texto original pertencem à Weinstein Books.

Bill: Pelas primeiras duas semanas, tudo estava quieto. Então começamos a ver carros. As pessoas dirigiam ao redor da casa. Alguns paravam, olhavam, e então iam embora. Havia este carro, um carro vermelho que estacionava na rua de frente e ficava lá. Eu o via pelas câmeras de segurança. Isto acontecia pelo menos duas vezes na semana. Algumas vezes, diariamente.

Eventualmente, eu acabei vendo a motorista. Era uma mulher, pequena, com cabelo castanho claro. Ela saía do carro e apenas dava uma volta. Eu tinha ouvido falar sobre os tipos de fãs que eram atraídas por Michael Jackson. Elas se apaixonavam por ele. Do ponto de vista de segurança, eu as percebia como uma ameaça primeiro. Quando você vê um carro estacionado do lado de fora do portão, você não sabe se é apenas uma fã ou alguém pior, um stalker, alguém que é completamente desequilibrado. Eu nunca havia visto essa pessoa antes então, numa tarde, fui até o carro e falei com ela. Ela era da Califórnia. Ela disse que não morava longe de Neverland. Ela disse que conhecia Michael e que ela era uma amiga dele. Eu disse, "Então você vai apenas ficar sentada aqui fora?"

Ela disse, "Está tudo bem. Ele sabe."

Sempre que saíamos, essa garota saía do carro para ser vista, esperando que ele a notasse. Geralmente era só eu ou Javon no carro e não podíamos parar. Na primeira vez em que saímos da casa com o Sr. Jackson na parte de trás, ela saiu do carro e eu disse: "Olha aquela garota de novo."

O Sr. Jackson olhou para cima e disse, "Quem?"

Eu disse, "Aquela garota ali."

Ele disse: "Ah, sim. Eu a conheço. Desacelere."

Paramos e ele abaixou o vidro da janela e eles tiveram uma conversa como se fossem velhos amigos. "Como estão as crianças?" "Você está gostando de Vegas?" "Você vai ficar aqui por muito tempo?" Ao ouvi-los conversar, eu não tive a sensação de que ela era uma stalker. Ela era apenas uma fã real e dedicada. A conversa parecia inocente, amigável, confiante. Com um pouco de flerte, para ser honesto. Eles só conversaram. Chegou ao ponto em que tive de lembrá-lo: "Senhor, nós temos de ir."

Ele disse a ela que horas estaríamos de volta e que esperava vê-la na volta, assim como você diria: "Vejo você mais tarde" a um bom amigo. Enquanto seguíamos, ele disse, "Sim, ela vai para onde quer que eu vá."

Perto do final de janeiro, o Sr. Jackson deu uma entrevista para a Associated Press, confirmando que ele estava de volta ao país. Depois disso, os fãs começaram a chegar. Eles estacionavam do lado de fora o dia todo. Normalmente, cerca de quatro ou cinco carros. Às vezes mais. Eles chegavam todas as manhãs, estacionavam em frente à casa, se sentavam em cadeiras de praia, iam para casa de noite. Sempre que nossos veículos deixavam a propriedade, o Sr. Jackson abaixava o vidro da janela e dizia, "Oi. Nós voltaremos em torno de vinte minutos." Seguíamos, e eles sentavam e esperavam por ele. Então voltávamos, ele acenava para eles, entrava na casa, e aí eles se sentavam e esperavam um pouco mais. Era a presença dele, a sua aura. Eles só queriam estar perto dele.

Javon: Os vizinhos odiavam. Os fãs eram geralmente bem comportados, mas este era um bairro residencial de alto padrão. O CEO da Sprint vivia ao lado. Gary Payton, o jogador da NBA, morava no mesmo bloco. Todas essas mansões milionárias e essas pessoas montando acampamento na rua.

Para os vizinhos, os fãs eram um incômodo. Estavam sempre chamando a polícia. Eles apareciam e incomodavam os fãs até eles irem embora. Então no dia seguinte, os fãs estariam de volta.

Bill: Um dia, havia três carros de polícia lá fora, e o Sr. Jackson os viu de sua janela. Ele foi até o trailer de segurança e me disse, "Eu não quero que os meus fãs sejam assediados. Eu preciso que você diga à polícia que não há problema neles estarem aqui, contanto que eles estejam do meu lado da propriedade."

Eu saí e disse isso aos policiais. Um deles me perguntou se eu era um residente. Eu disse, "Não, mas estou fazendo a segurança do dono da casa."

Ele perguntou: "E quem é ele?"

Eu não respondi. Só encolhi os ombros. Então um dos fãs disse, "Michael Jackson vive aqui."

Eu não confirmei ou neguei. Eu apenas disse. "O dono da casa não tem um problema com o fato dessas pessoas estarem aqui."

Os fãs começaram a bater palmas e a dizerem: "Viu? Viu?"

O policial os advertiu de que se eles fizessem qualquer barulho e ele tivesse de voltar, prisões seriam feitas. Eu não senti que aquele era o fim de tudo, e não foi. Os vizinhos continuaram a reclamar, e a polícia continuou a voltar. Finalmente, o Sr. Jackson disse que ia falar com o seu advogado. Eu não sei com quem eles falaram ou que pauzinhos foram mexidos, mas depois daquilo a polícia nunca voltou e os fãs ficaram.

Javon: Eles ficaram lá nos meses do inverno. Eles ficaram durante os meses do verão. Estava mais quente do que o inferno lá fora, e eles acampavam na calçada, esperando. Em dias muito quentes, o Sr. Jackson os enviava refrigerantes e pratos de petiscos. Para os que ficaram por muito tempo, ele nos mandou entregar cadeiras dobráveis. Nós até tiramos a mobília da casa da piscina.

Havia uma garota que estava inflexível sobre ver o Sr. Jackson. Ela estava lá todos os dias. Todos. Os. Dias. Ela alegava ter um lugar permanente na calçada junto à entrada da garagem, e ela estava sempre tentando passar coisas para o Sr. Jackson pela janela do carro. Uma vez, ela correu e entregou para o Sr. Jackson uma pilha de fotos nuas de si mesma. De alguma forma, ele sempre encontrava tempo para parar e conversar com ela.

Bill: Cada vez que ele saía de casa, os fãs corriam e tentavam obter um vislumbre dele. Se as crianças estavam no carro, nós mantínhamos as janelas fechadas e seguíamos; o Sr. Jackson não queria que ninguém ficasse muito perto de seus filhos. Mas se fosse apenas nós, ele insistia em parar e dizer Olá e assinava tantos autógrafos quanto possíveis. Sempre ficávamos nervosos com isso, mas ele insistia. A maioria deles era respeitoso, cortês, mas houve momentos em que as coisas fugiam do controle e eu tinha de saltar para fora do carro para que todo mundo saísse. Sempre que eu ficava assim, o Sr. Jackson me dava um sermão.

"Bill, seja gentil com os meus fãs," ele diria. "Eles não vão deixar nada acontecer comigo. Eles são inofensivos."

Parte de nossa apreensão era que, no início, não entendíamos o que era o seu relacionamento com seus fãs. Ficamos surpresos ao saber que ele manteve contato com alguns deles, se correspondia com eles. Eles ligavam para a sua empresária ou mandavam mensagens através dela. Quando ele falava com eles, havia um monte de trocas de "Eu te amo" e "Eu te amo mais". Eles estavam sempre trazendo-lhe presentes, coisas pessoais. Eles diziam, "Eu fiz isso pra você"; "Aqui é um bicho de pelúcia"; "Aqui está uma bugiganga do Peter Pan". 

Sua relação com seus fãs - eu nunca havia visto nada parecido com outras celebridades. Nunca. Não importa o quão famoso. Com outras celebridades, você via as groupies por aí, mas estas não eram groupies. O Sr. Jackson realmente conhecia muitos deles individualmente. Ele lembrava em que show eles os havia conhecido, há quantos anos eles se conheciam. Ele apontava para os fãs que havia visto em outros países. Aqui estávamos nós em Las Vegas e ele dizia, "Aquele ali, eu me lembro dele na Alemanha."

Era uma relação interessante, ele e os fãs. Ele os amava tanto quanto eles o amavam.

Da janela do seu quarto no andar de cima, ele podia olhar diretamente para a rua onde eles estavam acampados. Algumas vezes olhávamos para cima e podíamos vê-lo, olhando por trás das cortinas, apenas os observando. Eles sentavam e esperavam; ele sentava e assistia.



 Traduzido por Bruno Couto Pórpora