quinta-feira, 3 de julho de 2014

A Tecnologia do Michael Jackson Renascido (FX Guide)

FX Guide, 16 de junho de 2014
Por Mike Seymour

Stephen Rosenbaum foi encarregado de criar digitalmente um dos performers mais famosos do mundo, Michael Jackson, para promover uma nova música, Slave To The Rhythm, no evento ao vivo da premiação da Billboard. Foi uma performance digital com excelente animação facial construída sobre uma série de tecnologias, de captura facial LightStage a captura de movimento.

Dada a enorme importância de Michael Jackson para a música em geral e sua reputação global de impressionantes apresentações ao vivo, o trabalho de permitir que o público o assista se apresentar mais uma vez trouxe consigo uma quantidade justificável de pressão. Obviamente, depois de décadas de desfrutar de suas performances, o publico sabe como Jackson se movia, como ele se parecia e, literalmente, nada menos do que algo incrivelmente preciso iria impressionar.

Stephen Rosenbaum concluiu o projeto de sua base em São Franciso. De fato, enquanto a FXGuide conversava com Rosenbaum, ele estava sentado onde costumava ficar quando começou sua carreira, quando a empresa ainda era a ILM - uma ironia que não foi perdoada pelo supervisor de efeitos visuais. "Esta é a sala onde eu comecei minha carreira há 25 anos atrás, então eu estou literalmente sentado em um dos meus escritórios antigos onde Joe Letteri sentou, onde Scott Anderson sentou, onde um grupo de todos nós começou nos primeiros dias da ILM. E a decoração não mudou," ele brincou.

Antes deste projeto, Rosenbaum e sua equipe estavam empenhados na modernização de uma animação. Foi essa riqueza de experiência que os tornou uma ótima escolha para esta produção. O Espólio de Michael Jackson trouxe o projeto para Rosenbaum e a Pulse Evolution (empresa especialista em animação humana) em outubro de 2013. À luz da atual migração de projetos da Califórnia para o Canadá e além, Rosenbaum ficou particularmente feliz por participar de um trabalho de alta qualidade, usando dos talentos massivos dos artistas que ainda estão na Califórnia. "Uma das coisas que é tão emocionante neste projeto é que estamos aplicando nossas habilidades e conhecimentos em uma área que permanece, em grande parte, inexplorada," diz ele.

Para ajudar com a precisão na dança, estilo e abordagem, foi oferecida a Rosenbaum a chance de trabalhar com dançarinos, artistas e especialistas de figurino que haviam trabalhado pessoalmente com Michael Jackson. Isto provou ser inestimável. Além de uma grande variedade de imagens de referência, Rosebaum pôde conversar diretamente com pessoas que podiam falar como Michael Jackson abordava sua arte e como ele resolvia problemas de forma criativa. "Eu podia virar para eles e dizer que aqui havia um trecho específico da performance, eu ia fazê-lo dar um passo, e eles então me diziam, 'Bem, na verdade Michael poderia ter feito isso - virado sua cabeça para o lado, ao invés de para trás - porque esta era a forma como Michael estaria pensando'," explica Rosenbaum.

Reconstruindo uma lenda

A decisão de que idade Jackson deveria ter na performance foi, ao menos em teoria, bem aberta. O artista poderia ter qualquer idade, já que sua carreira se estendeu por décadas. Na realidade, um "gesso" real do rosto do cantor feito em 1997 fez com que esta fosse a idade do Jackson que o mundo veria: 39 anos. Foi com esta idade que o veterano em efeitos especiais, Stan Winston, fez um molde de gesso do cantor para o projeto Ghosts. A equipe teve acesso ao gesso original e digitalizou o molde. Por mais grandioso que o trabalho de Stan Winston sempre foi, o próprio peso do material e os agentes usados para evitar que o gesso cole no rosto podem preencher os poros da pele. Então, embora o gesso fosse uma ótima medida das dimensões do artista, não era tão preciso quanto as técnicas atuais para textura precisa dos poros da pele. "Nos levou até uns 75% do caminho," estima Rosenbaum.

"A pressão do alginato (gesso) não só empurrou para fora algumas das características dos poros, mas também algumas das características faciais, queixo, pele em geral," acrescenta Rosenbaum. "Michael tem um rosto muito original, e parte do seu rosto era mais suave (e assim, foi mais afetada), então tivemos um desafio; também tivemos o desafio fisiológico de como achávamos que Michael Jackson se parecia aos 39 anos, qual era nossa percepção dele, mas a partir de centenas de imagens que recebemos do Espólio chegamos a como ele deveria se parecer."

A outra questão é que o gesso é só uma pose neutra. Em termos modernos, se um ator está sendo digitalizado, seria normal obter várias poses FAC além da pose neutra, para que os animadores pudessem ver como o rosto se expressa em diversas poses. Com apenas este gesso, a equipe trabalhou com limitações.

A combinação de não ter os detalhes dos poros da pele e nem poses diferentes levaram Rosenbaum a decidir procurar mais referências para conseguir detalhes extras. Embora estas pessoas não fossem, obviamente, o real Michael Jackson, a equipe apenas precisou estender detalhes de alta frequência - perdidos do gesso original - e obter imagens de referências. Enquanto muitas cenas reais de Michael Jackson tenham sido usadas como referência, poses FAC são muito particulares e filmadas sob controle de luz. A equipe também filmou expressões icônicas para analizar e estudar. "Michael tinha uma maneira muito distinta de se mover," fala Rosenbaum, "então os fizemos tentar igualar algumas das expressões icônicas das performances do seu ídolo, e então por cima das expressões FAC criar conceitos adicionais, e isto foi fundamental para o nosso sucesso - não apenas confiar no que os músculos faciais tecnicamente fazem, mas também em como Michael poderia ter se expressado."

Ao contrário de tentativas anteriores de recriar este performer, a boca de Michael Jackson ficou muito visível no palco. Ele se apresentou sem o uso de um microfone de mão em frente de sua boca, como na recriação de Tupac Shakur. Isto significa que a boca ou sincronia labial precisava ser muito mais precisa do que as dos "hologramas" anteriores. Michael Jackson tinha um cabelo muito distinto que precisava ser recriado. "Ao contrário de Tupac, que era careca, Michael usava seu cabelo deliberadamente durante a performance, quando ele dançava," nota Rosenbaum. "Ele o usava como parte de sua expressão."

Importantes pesquisas acadêmicas foram feitas recentementes na área de micro-geometria para melhorar a precisão facial. Rosenbaum tinha o desejo de usar esta inovação para o holograma. Estes mapas "provaram ser muito valiosos para nós e um passo significativo no desenvolvimento visual, mais do que havia sido feito em projetos anteriores," diz ele. A lógica da micro-geometria é interessante. Seria razoável pensar, à primeira vista, que qualquer personagem não visto em close-up extremo não se beneficiaria da micro-geometria de escala muito pequena. Mas o que foi encontrado nas pesquisas recentes é que, embora o detalhe dos poros em si não seja visível, o realce muito maior que um rosto ou testa exibe muda profundamente com o acréscimo da micro-geometria à pele do rosto. Embora a resolução dos poros da pele seja muito pequena, o realismo dado ao rosto ganha grande reforço pela modelagem da pele a níveis aparentemente incríveis de detalhe.

"O que descobrimos é que a espetacular contribuição à pele é vital," indica Rosenbaum. Pesquisas anteriores haviam sugeridos dois lóbulos espetaculares que contribuem para a resposta global da pele do rosto, "e nós, na verdade, incorporamos três," diz Rosenbaum. "Você não percebe, à primeira vista, que você está olhando para três níveis de contribuição espetacular. O rosto, a testa, ou o queixo - eles têm diferentes respostas dentro do próprio realce. Foi o principal fator que contribuiu para chegarmos a uma pele com aspecto realista.

Os realces, vistos pela micro-geometria, embora sendo mais realistas, podem ser mais intensos - de forma que um maquiador possa querer reduzí-lo em um set real. Por este motivo, e pelo realismo do que Jackson poderia realmente ter usado, maquiagem 'digital' foi acrescentada para imitar o look correto que o cantor poderia ter usado. Isto foi fundamental na mudança de uma pele realista geral para uma pele realista de Michael Jackson, se apresentando em grande evento. A maquiagem digital foi baseada em "muitos testes que fizemos com maquiagem real," conta Rosenbaum. A equipe examinou alguém com e sem maquiagem para notar as diferenças na espetacular contribuição que a maquiagem profissional daria ao holograma. A solução final envolveu múltiplas camadas desta sutil mas importante maquiagem "digital".

Os mapas finais foram de 6x8K, e renderizados em RMS 18 (RenderMan). "Tudo foi feito com ray tracing*," comentou Rosenbaum. Enquanto a equipe usava tecnologia de ponta - SubSurface Scattering (SSS), "o que estava dando mais realismo foi a micro-geometria."

Para os olhos do cantor, a equipe recebeu grande ajuda do Espólio e dos dançarinos e artistas que trabalharam com Jackson. "Ele sempre comandou a multidão," diz Rosenbaum. "O que descobrimos é que alguém pode dançar para si, mas Michael era um artista tão consumado, ele pensava menos em sua performande do que a sentia. Ele olhava e fazia um profundo contato visual com a plateia."

"Embora o rosto tenha sido onde enfatizamos os esforços de desenvolvimento visual, muito tempo e energia foi colocado em seu corpo e desempenho geral como performer para reforçar a semelhança completa de Michael," comentou Stephen Rosenbaum.

Figurino

Para a grande habilidade como cantor e dançarino, Michael Jackson também era um showman e seus figurinos sempre foram importantes. Aqui o time foi sortudo o suficiente para poder trabalhar com o figurinista de Michael Jackson, Michael Bush. Isto não foi útil só em planejamento, mas o figurinista esteve acessível durante toda a produção para aconselhar. Bush havia criado a maioria do guarda-roupa pessoal e de turnês de MJ no passado. O figurino visto no palco é um novo design de um traje que poderia ter sido usado neste período da carreira do cantor; ele criou esta peça apenas para o show. "Nós tivemos um monte de conversamos sobre como Michael usava suas roupas e os tipos de roupa que ele usava e como elas ficavam em seu corpo," diz Rosenbaum.

O novo trabalho teve um olho no futuro. Em muitos aspectos, assim como o gesso feito durante Ghosts se tornou inestimável anos depois, a equipe quis se assegurar de que este trabalho seria bem documentado no caso dele ser desejado ou precisado para qualquer projeto futuro. "Nós construímos detalhe facil, cabelo, olhos - tudo na mais alta qualidade. Na verdade, estávamos trabalhando com resolução 7.5K," uma resolução significamente maior do que a projetada naquela noite.

"Nós construímos a performance para ser re-utilizada," acrescenta Rosenbaum. "Eu sempre fui um fã, e acho que ele estava ótimo." Os resultados foram bem recebidos. Após a performance, a equipe a exibiu para Jackie Jackson, irmão de Michael. "Nós repetimos para ele após o show e ele sorriu o tempo todo dizendo 'Este é o Michael, é o Michael' - você podia perceber que ele acreditava que o que havíamos feito era fiel à persona de Michael e seu estilo de performance."




* Ray tracing (traçado de raios) é um algoritmo de computação gráfica usado para síntese (renderização) de imagens tridimensionais.




 Traduzido e editado por Bruno Couto Pórpora