sexta-feira, 25 de julho de 2014

A Explosão Jackson (People, Julho 1984)

People, 23 de julho de 1984
Por William Plummer, relatado por James McBride

Quatro horas antes do show na sexta-feira, os seis músicos na banda da turnê dos Jacksons andavam nos seus quartos no quinto andar do Alameda Plaza Hotel em Kansas City. Veteranos no estúdio e em concertos ao vivo, eles ensaiaram os 110 minutos de extravaganza multimídia por mais de três meses (mais recentemente durante uma passagem de som que durou até as 4 daquela manhã), mas toda a preparação não conseguiu acalmar o nervosismo da noite de estreia. Enquanto esperavam para embarcar nas vans não-sinalizadas que iriam transportar a equipe e os irmãos Jackson para o lotado estádio Arrowhead, eles fumavam muito, consultavam seus relógios e perambulavam. "Estou com uma borboleta do tamanho do [monstro de sci-fi] Rodan no meu estômago," riu o tecladista Pat Leonard, 28.

O enclave dos Jacksons no sexto andar - onde placas de "Não Perturbe" foram colocadas nas maçanetas - estava em silêncio absoluto. Dentro da suite de Michael, o próprio Homem fazia exercícios vocais. Em um quarto próximo, os irmãos Randy, Tito, Jermaine e Marlon - exceto Jackie, fora por conta de uma operação no joelho - ensaiavam harmonias e se concentravam para o começo da turnê de 13 cidades e U$50 milhões que pode marcar a despedida do grupo familiar que estreou em 1965. O irmão mais novo, Randy, estava se exercitando, tentando superar a dor na sua perna esquerda, causada por um acidente de carro em 1980. "Sabe, como um boxeador se sente antes de uma luta?" ele perguntou. "É assim que eu me sinto. Quero nocauteá-los."

"Analgésicos," acrescentou Marlon. "Nós dizemos à plateia para trazer analgésicos quando vem nos ver. Nós queremos ser tão bons, tão fortes, que os faça doer."

Os Jacksons lotaram o estádio Arrowhead por três noites, e a principal reclamação entre os 135.000 que presenciaram seu espetáculo foi de que os irmãos não os nocautearam o bastante. "Eu queria ver o dobro," disse Donna Slonaker, 19, de Lydon, Kansas, "mas eu pagaria U$30 para ver de novo."

Após meses de polêmicas, suspense e confusão, a Victory Tour dos Jacksons - intitulada em homenagem ao recem lançado álbum que já vendeu quase duas e meio milhão de cópias - estava finalmente na estrada, com próximas paradas em Dallas, Jacksonville, Nova York e além. É esperado que todos os cinco Jacksons toquem em 47 datas em 16 semanas - que geraram entre U$50-60 milhões em bilheteria - e um possível lucro de U$8 milhões.

Quando eles não estavam lidando com as fortes críticas sobre a exorbitante política de compra de ingressos por correio (a qual foi mudada), e as exigências do promotor Chuck Sullivan para taxas mais baratas de hospedagem e espaço grátis para anúncio nos jornais, o unido quinteto passou seus dias anteriores aos shows polindo o ato. Sem sinal das festas ambiciosas que caracterizavam as turnês de rock: refeições preparadas pelas duas cozinheiras dos Jacksons e levadas para os irmãos na privacidade de seus quartos. Momentos de lazer foram devotados a tocar guitarra e (no caso de Michael) autografar fotografias. O Enluvado escapou do hotel (por um elevador que levava à garagem) para assistir 'Os Caça-Fantasmas' e anunciar publicamente que ele iria doar sua parte do lucro dos shows para caridade. Na tarde de sexta-feira, ele acompanhou Tito a um hotel local para receber o prêmio NAACP. Após esta saída, os Jacksons se mantiveram quietos até a noite de sexta, quando figurinistas chegaram para ajudá-los com as roupas do número de abertura. Às 21h, os cinco entraram em uma van para a viagem de 30 minutos até o estádio, onde o frenesi atingia seu ápice.

A plateia que os esperava era uma amostra de Whitman sobre os habitantes do centro dos EUA. Eles chegavam em pick-ups enlamaçadas e vans customizadas - e não apenas adolescentes usavam camisetas com a imagem de Michael, mas idosos também, e mães com crianças pequenas, e uma aliança de paz que apenas os Jacksons conseguem: jovens com seus pais. Disse Andrea Gilliard de Stanley, Kansas, do alto de seus 30 anos, "Você nunca está velha demais para ver Michael Jackson. É o melhor show que já vi, e eu já vi os Stones e os Beatles. Mas por que ele não cantou Thriller?"

Bem, porque provavelmente ele queria deixar seus fãs a par do filme que é exibido diariamente por trás de seus olhos. O roteiro, para o qual o ídolo andrógino desenhou os storyboards, é uma lenda baseada no Rei Arthur como se enfeitada pelo criador de Star Wars, George Lucas, com asistência do Muppeteer Jim Henson. Na abertura do show, monstros gigantescos e animados emergem no palco, para serem desafiados por Randy (aparentemente o herdeiro criativo de Michael), trajando uma armadura brilhante. Randy retira uma espada iluminada por lasers de uma pedra, assassina uma das criaturas e ordena, "veja o reino." Coberto em fumaça e luzes verde, azul e púrpura, o set se eleva e aparecem os irmãos, que fazem uma dramática descida pelas escadas, para uma ensurdeçedora onda de gritos.

Apesar de Jermaine ser o vocalista principal em três de suas próprias canções e dos outros Jacksons terem seus momentos, Michael domina o palco central. Resplandecente em uma jaquela de lantejoulas prata com uma faixa vermelha e branca (um de seus quatro figurinos), ele salta no ar, fica imóvel, cai de joelhos e se lança a uma posição fetal. Ele é arrogante em Beat It, terno em She's Out of My Life, triunfante em Billie Jean. Sua Heartbreak Hotel é também tão cheia de giros, paradas, batidas e estalos que quando ele termina a plateia procura por feridas imaginárias em seus braços.

A turnê dos Jacksons é uma produção espetacular, e vem com um preço também espetacular: na faixa dos U$15 milhões, diz o promotor Sullivan. O palco de 375 toneladas, ele mesmo um elemento caro, tem a altura de um prédio de cinco andares, com 49 metros de largura e 27.5m de profundidade. Ele possui sete computadores e cinco elevadores que precisam de 22 homens para serem operados. O que com as 120 caixas acústicas, 2.200 luzes, suportes e cabos acrescentam mais 29 toneladas na bagagem dos Jacksons. O número de membros da equipe chega a 1.500, incluindo aqueles contratados localmente para organizar o final do concerto - um show de fogos de artifício.

No Arrowhead, mais de 170 policiais dos departamentos da área mantiveram a paz. Eles foram auxiliados por 375 guardas contratados pela gerência do estádio, nove paramédicos, dois médicos e seis enfermeiras. Um helicóptero e quatro ambulâncias estão a postos, e a multidão passou por cerca de 70 seguranças com detectores de metais para entrar no estádio. Na realidade, a segurança estava tão reforçada que o próprio Sullivan teve seu acesso aos bastidores negado quando esqueceu seu passe na noite de estreia.

Felizmente, a equipe da turnê dos Jacksons - que já estava preparada para um desastre do nível do show de 1969 dos Stones em Altamont - foi confrontada com a docilidade de uma reunião social de igreja, uma decente reflexão do próprio Michael Jackson. Apenas nove prisões foram feitas no Arrowhead, disse um porta-voz do estádio, a maior parte por má conduta. O único real problema foi Don King, o czar do box e outrora promotor de turnês. Suplantado por Sullivan em junho, ele todavia continua a falar como se estivesse comandando o show. "Estamos viajando por território virgem," ele anunciou ao dar uma entrevista para a imprensa, no salão do Alameda Plaza. "Não há limites. Se Michael tivesse tempo para trabalhar tão duro quanto Wayne Newton, 150 shows por ano, ele podia fazer U$200 milhões. Mas quem quer trabalhar tanto assim?"

Os Jacksons já trabalharam duro o suficiente. Mas a ameaça de exaustão parecia irrelevante para Randy, que trocava de uma cadeira para a outra no hotel no sábado, enquanto descansava da eletrificante noite de estreia. "Foi ótimo estar de volta aqui," ele disse. "Minha perna estava me matando, mas sabe que foi a melhor abertura que já fizemos. Depois do show, não consegui dormir. Minha mãe me ligou apenas para dizer 'Eu te amo e achei que você estava bem'. Minha mãe é puro amor."

Enquanto isso, em Jacksonville, o prefeito Jake Godbold também se apaixonava. "É hora de alcançarmos as estrelas," ele disse. Godbold calculou que a estadia de três dias dos Jacksons em sua cidade poderia custar U$445.000 em salários e promoções ao governo local - uma insignificante quantia comparado ao que os visitantes devem gastar em alojamentos, refeições, combustível e souvenirs de Michael Jackson. "Setenta milhões de dólares," ele disse para os membros da Câmara Municipal, prolongando a última palavra. "Setenta milhões de dólares"




 Traduzido por Bruno Couto Pórpora