segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A Maior Guerra Pop do Rio (O Globo, Setembro 1993)

O Globo, 8 de setembro de 1993
Por Luiz André Alzer e Sidney Garambone

Show de Michael Jackson engole o de Madonna na preferência de personalidades

Uma pinta o cabelo. O outro a pele. A primeira virou louraça. O segundo, um branquicela. Lanternagens à parte, Madonna e Michael Jackson estão prestes a parar o Rio. Ambos farão show na cidade, numa coincidência pop mais incrível que papo-cabeça de astrologia.

Madonna já engatou a primeira marcha. The Girlie Show tem chamada na televisão, está marcado para o dia 6 de novembro no Maracanã e até sexta-feira os organizadores garantem que os ingressos estarão à venda. Jackson, que se apresentará antes da rival, está em ponto morto. Só depois de amanhã a produtora Marlene Mattos avisa onde, quando e quanto será o show. De certo só o mês de outubro, provavelmente no Maracanã. A cariocada, atenta e ansiosa, já começa a discutir. Em qual show ir? Por enquanto, está dando Michael Jackson. Das 35 pessoas ouvidas pelo GLOBO, 66% preferem ir ao show dele; 34% ao de Madonna.

- É mais minha praia. Gosto muito de funk. O som do Michael é melhor - raqueteia Erasmo Carlos.

Mas o litoral carioca é enorme.

- Não é minha praia, além do mais, a Madonna é mais gostosa. Prefiro ir ao dela - rebate o baterista Oscar Bolão, da Orquestra de Cordas Brasileiras.

A discussão atinge cifras humorísticas.

- Para ver mulher, prefiro ver mulher de verdade: Madonna! - opina José Wilker.

William Bonner contesta sutil:
- Ela tem músculos demais. E faz o marketing da vaca.

Mamífero ou não, Fausto Fawcett já pensa alto:
- Junto com o Sendero Luminoso, os dois são os maiores artistas da mídia de todos os tempos. Estou pensando em convidá-la para uma canja no meu show de louras.

Inocentes são os que pensam que o escândalo juvenil na carreira de Michael Jackson não influenciou a opinião do pessoal. A apresentadora Leila Richers ia cravar Madonna, mas mudou:
- É melhor ver logo o Michael antes que a carreira dele acabe.

A cantora Silvia Massari já viu Michael. Não num show. Na TV Tupi, lá no final dos anos 70, quando o Jackson Five veio ao Brasil. E foi elogiada:
- Ele era tão bonitinho, tinha o cabelo crespinho, e disse que minha voz era muito bonita. Madonna não! Sou contra a apelação que ela faz.

Volta o humor. Na voz de Bussunda, que quer ir ao show da Madonna e ficar bem pertinho do palco:
- Michael é a alegria das criancinhas, mas prefiro louras a morenas.

Entra o sexo.

- Madonna é fantástica, sexualmente uma mulher incrível, eletriza todo mundo - garante Bemvindo Sequeira.

Ué, ela já veio antes?

No Rio não. Em Paris várias vezes. O cineasta Louis Malle estava na cidade-luz quando a mulher-luz cantou por lá:
- Ela é muito interessante. O show foi incrível. Que personagem.

Só que Madonna começou a cantar depois de mocinha. Talvez isso tenha atrapalhado sua votação. O depoimento de Fátima Bernardes explica tudo:
- É uma afeto sentimental, desde pequena a gente ouve ele. One Day In Your Life...

Patrícia Pillar concorda e acrescenta:
- Ele me faz dançar e tem musicalidade.

O músico Cláudio Zoli aproveita e descasca a loura oxigenada:
- Ela é uma utopia sexual. Abusa do sexo no trabalho. Tenho uma identificação com Michael Jackson.

Aí se ouve a opinião do cineasta Silvio Tendler.
- Ainda sou das antigas, prefiro ver mulher.

Ai se ele ouve a opinião do artista plástico Pojucan.
- As meninas adoram ver o show dele pois se identificam. Ele também gosta de meninos.

Quanta maldade.

Nota-se que a discussão musical passou ao largo das opiniões. Sinal dos tempos. O que vale é a "postura". A "atitude". Não importa a música. Até mesmo quando é boa.

- Quer saber? Não voto em nenhum dos dois. O que eles fazem é um absurdo. Uma falta de pudor, uma decadência moral! - se indigna Clóvis Bornay.

Bota sinal dos tempos nisso.