Folha de São Paulo, 22 de março de 1983
Por Pepe Escobar
Quando Michael Jackson lançou Thriller, seu último LP, a expectativa nos meios musicais era enorme. Uns achavam que seria mais uma sucessão de insípidas pop songs desfiladas com vocais esganiçados e irritantes - embora os arranjos fossem competentes. Outros acreditavam em uma nova alquimia sonora capaz de revolucionar os caminhos da música negra nos anos 80.
Prevaleceu o segundo ponto de vista. Thriller é para a música negra um álbum tão importante quanto os antológicos testamentos perpetrados por James Brown, Sly & The Family Stone e Marvin Gaye em sua época de ouro, Michael, 24 anos, canta como um performer experimentadíssimo, e não mais como um garotinho oco. Sua voz é o melhor instrumento do disco; uma das mais refinadas da música contemporânea. Conta, naturalmente, com uma magia extra: a produção de Quincy Jones. Mr. Jones fez um pacto demoníaco e consegue realçar nuances impossíveis dos straight funk, baladas e rocks de Jackson. É um álbum de audição absolutamente compulsiva.
Trata-se, sem dúvida, da história de um super-hit. Thriller já vendeu mais de 5 milhões de discos só nos EUA. Pela 3ª semana, está em primeiro lugar na lista dos mais vendidos da Cash-Box, seguido por Business as Usual, o dançante LP de estréia do Men at Work. The Girl Is Mine, apesar de algo soporífera - porém extremamente "catchy" e bem-arranjada - estourou em compacto simples. A seguir foi a vez da explosiva Beat It, com o flamejante solo de guitarra de Eddie Van Halen. Agora Billie Jean, sem dúvida a melhor faixa de Thriller, chega ao 1º lugar em compactos simples nos EUA, tanto na lista da Cash Box quanto da Billboard.
Billie Jean é tão precisa que chega a ser desconcertante: seção rítmica esparsa e econômica, toques de cor via os sintetizadores polifônicos e cordas de Mr. Jones, e Michael literalmente sangrando nos vocais: "Billie Jean não é minha amante/ela diz que eu sou o seu homem/mas o garoto não é meu filho." O resultado é fatal, tanto na pista de dança, no rádio do carro, no walkman ou para se ouvir a dois. Junte-se a Thriller os excepcionais The Message, com Grandmaster Flash & The Furious Five, e Midnight Love, com Marvin Gaye, e está pronta a receita contra qualquer crise, pelo menos nos últimos tempos.