Entrevista para a revista Blues & Soul, 6 de maio de 1980
Tradução de Bruno Couto PórporaB&S: Primeiramente, Michael, você gostaria de comentar sobre o seu sucesso nas enquetes da B&S?
MJ: Eu estou muito honrado e feliz por ter sido escolhido em tantas categorias, e eu sinto como se fosse uma recompensa as pessoas amarem o que eu faço. É tão maravilhoso que todo o trabalho e energia gastos sejam recompensados. Significa muito mais do que dinheiro. Aceitação é algo que eu não tomo como desimportante e eu estou muito feliz com tudo isso.
B&S: Obviamente, muito da aclamação vem do álbum Off The Wall e pessoas da indústria já estão se referindo a ele como o "Álbum de Maiores Sucessos de Michael Jackson" por conta de todos os singles de sucesso que saíram do disco. Olhando pra trás, te surpreende o fato do álbum ter se saído tão bem como saiu?
MJ: Eu pensei muito a respeito disto. Quando Quincy (Jones) e eu começamos o projeto, nós sentamos e discutimos exatamente o que queríamos e tudo saiu do modo que planejamos. Nós pré-decidimos todo o processo do álbum mas, definitivamente, ele saiu melhor do que esperávamos. Nós tínhamos como meta a platina tripla e agora já está a caminho dos cinco milhões!
B&S: Quando você planeja começar a trabalhar no seu próximo álbum solo?
MJ: Bem, nós estamos trabalhando num álbum dos Jacksons agora então provavelmente vai demorar um pouco. Provavelmente, no ano que vem. Eu sempre tive o medo de me exceder e isto acontece em qualquer negócio. Superexposição pode prejudicar muito neste meio então eu quero levar o meu tempo para acertar. O próximo tem de ser três vezes melhor do que este - não pode ser só tão bom quanto porque seria uma decepção. Por isso, quero levar o meu tempo para acertar.
B&S: Você não sente que pode perder essa euforia conquistada por Off The Wall?
MJ: Eu não acho. Mas veja, há outros desejos profundos que eu tenho - especialmente filmes. Mas, por conta das turnês e gravações - que eu amo fazer, é claro - eu não posso me envolver tanto com cinema quanto eu gostaria. Isto me incomoda porque é algo que eu gostaria de fazer. Mas também, o álbum dos Jacksons vai demorar a sair.
B&S: Quando é esperado que se termine o álbum dos Jacksons?
MJ: Essa é sempre uma pergunta difícil porque quando eu entro num projeto, eu sempre busco a perfeição e cada projeto tem de ser três vezes melhor do que o que fizemos antes. Isto leva tempo porque eu não gosto de seguir um rastro, eu gosto de fazer um caminho. Não imitando. Mas você pode esperar que ele esteja pronto em junho.
B&S: Como podemos esperar que o novo álbum se diferencie de Destiny em conceito e estilo?
MJ: Destiny foi o começo de toda a coisa e o momento era perfeito. Mas ainda há tanto a vir e para este, nós estamos tão mais abertos e livres. Estamos realmente animados com ele.
B&S: Vocês estão todos escrevendo o material e produzindo novamente?
MJ: Sim, nós estamos.
B&S: Para o seu próximo álbum solo, você espera trabalhar com Quincy novamente?
MJ: Claro - é uma promessa! Trabalhando com Quincy eu aprendi tanto e eu sou muito ganancioso por conhecimento. Para mim, aprender algo a que sempre ansiei me faz feliz. E trabalhar com Quincy foi uma experiência maravilhosa. Tão maravilhosa. Eu nunca me esquecerei de observá-lo trabalhando porque ele não conhece limitações. Ele até me deu um apelido - Smelly (*Fedido)! Ele nunca me chama de Michael!
B&S: Haverá uma turnê dos Jacksons neste ano?
MJ: Eu acho que sim mas não tenho certeza. Nós queremos!
B&S: Você gosta de fazer turnês?
MJ: Alguns aspectos - muito. E eu já escrevi muitas canções na estrada. Eu amo estar no palco e eu adoro ver as diferentes cidades e experimentar sua cultura, lugares e a arte local e as línguas diferentes. E, é claro, eu amo conhecer os fãs porque esta é a razão pela qual fazemos as turnês - para ficarmos cara a cara com as pessoas que compram os discos. Você nunca tem a chance de vê-las colocar a agulha no disco, por isso as turnês são o mais próximo que você pode chegar e é maravilhoso saber que as pessoas da platéia admiram a sua música e têm seus discos em casa.
B&S: Nós sabemos que você está ocupado com diversos outros projetos no momento - você gostaria de nos dar um panorama deles?
MJ: Bem, eu fiz um single chamado Night Time Lover para minha irmã LaToya que será lançado muito em breve.
B&S: Você escreveu a música, produziu e fez os arranjos?
MJ: Sim, eu fiz.
B&S: Esta é a primeira vez que você produz sozinho?
MJ: Bem, eu co-produzi Don't Stop com Quincy e também fiz os arranjos. E meu irmão Randy e eu co-produzimos Shake Your Body.
B&S: Você não está fazendo também algo com o Neil Diamond?
MJ: Sim. Eu estava na praia há dois domingos atrás e Neil Diamond estava na casa ao lado e então começamos a conversar. Eu perguntei a ele como ia o filme dele e ele começou a me contar que ia dançar pela primeira vez. Agora, eu nunca vi o Neil dançando, mas ele disse como queria surpreender todo mundo que achava que ele não sabia dançar. Ele sente que tem ritmo e que se se esforçar, conseguirá.
Ele então me falou que havia adorado The Wiz e que havia assistido umas duas vezes e tinha gostado bastante da minha atuação e ele me perguntou se eu o ajudaria com a coreografia. Ele até quer que façamos uma música juntos. É algo que eu adoraria fazer e eu acho que será muito divertido.
B&S: Michael, nós sabemos que você não gosta de dar entrevistas e que você tem um motivo válido para se sentir assim. Para a curiosidade dos seus fãs, você gostaria de falar para nós sobre isto?
MJ: Esta é a verdade, juro por Deus. O que uma pessoa diz significa tanto para mim. Pode mudar toda a opinião que uma pessoa tem sobre a outra. Eu vi isto acontecer tantas vezes - Charlie Chaplin, Paul Robeson, Jane Fonda. Todos são pessoas que fizeram declarações e a opinião do mundo em relação a eles começou a mudar. Meu maior medo é ser mal interpretado. Uma palavra pode ser retirada de uma declaração e mudar todo o sentido para distorcer o que realmente era.
Ultimamente, as pessoas têm distorcido tudo o que eu tenho dito e é por isso que eu evito entrevistas. Eu não gosto de ser mal interpretado pelos meus fãs. Eu aceito que não posso conter boatos - tudo bem! Mas quando é algo sério e me citam de maneira equivocada, isto é muito errado!
Muitos gênios de áreas diferentes foram prejudicados por isto. Como Charlie Chaplin sendo chamado de comunista. Ou a maneira como Paul Robeson foi tratado. Então, se não vão me citar corretamente, prefiro simplesmente que não me citem. Essa pode ser a diferença entre sucesso e fracasso. Eu sinto que estou aqui na Terra para fazer um certo trabalho e que estou apenas cravando a superfície e eu não quero que as pessoas tenham impressões erradas sobre mim.
B&S: Michael, voltando aos velhos tempos do Jackson 5, o que você se lembra mais dessa época?
MJ: O que eu me lembro mais dessa época - e a razão pela qual estamos aqui hoje como entertainers - era de ensaiar sete horas por dia. Direto depois da escola, nos aperfeiçoando e com nosso pai nos ensinando. Embora ele tivesse uma banda, ele nunca foi realmente um showman mas ele sabia exatamente o que eu tinha de fazer para me tornar um. Ele me ensinou como segurar um microfone e fazer gestos à multidão, por exemplo. E como lidar com uma platéia.
É incrível como ele podia estar tão certo sobre as coisas e ele foi o melhor professor que poderíamos ter. Eu nunca esquecerei disto porque foi o que começou tudo de verdade - nossa mãe e nosso pai.
B&S: Na época, aquilo fez sentido pra você?
MJ: Para lhe dizer a verdade, aconteceu naturalmente e eu apenas cantava e soava agradável pra mim!
B&S: Quando criança, você sempre quis ser um performer?
MJ: Sim, eu queria. Quando James Brown ou Sammy Davis Jr. apareciam na TV, era excitante pra mim - e eles ainda são meus ídolos hoje.
B&S: Você se arrepende do fato de ter começado tão cedo e não ter tido uma adolescência normal?
MJ: ... não. Eu acho que começar cedo é a melhor coisa numa profissão que exige tanto esforço. Eu apenas agradeço a Deus pelo meu talento.
B&S: O quanto de ajuda e influência você recebeu de Diana Ross no começo de tudo?
MJ: Diana foi - e ainda é - como uma administradora do grupo. Como também foi Berry Gordy - eram eles dois. Você sabe, o Berry apenas empresariou dois grupos na vida dele, em toda a história da Motown - as Supremes e o Jackson 5. Mas quando nós fizemos um teste para o Berry em Detroit, a Diana se aproximou quando terminamos, nos beijou e nos disse que iríamos muito, muito longe e que ela queria fazer parte disso - e foi o que ela fez. Em todas as coisas que fizemos juntos - como o The Wiz ou os especiais para a TV - ela sempre nos apóia 100% e sempre se certificando de que tudo estava correndo bem pra gente.
B&S: Então, ela é alguém muito especial para você?
MJ: Muito!
B&S: Apenas por curiosidade, quais são suas canções favoritas do Jackson 5 na Motown ou as suas solo antigas?
MJ: Eu acho que Never Can Say Goodbye, I'll Be There e Ben são minhas favoritas.
B&S: Você gostou do modo como a Gloria Gaynor gravou Never Can Say Goodbye?
MJ: Sim, gostei - embora ela tenha mudado o tempero da música. Muitas pessoas dizem que essa gravação foi o começo da música disco e ela certamente imprimiu muito ritmo na música. A nossa era mais concentrada na beleza da melodia. Eu também gosto da forma como Isaac Hayes gravou a música também, a propósito.
B&S: Como você se sente em relação a esta situação recente com a Motown, onde eles agora são detentores oficiais do nome "The Jackson 5"?
MJ: Quando nós perdemos nosso nome original, nos sentimos perdidos. Sabe, nós tínhamos este nome muito antes do contrato com a Motown e era a nossa identidade. Mas, conforme o tempo vai passando, parece importar menos e menos e hoje nos identificam como os Jacksons sem problemas, então não causou nenhum dano permanente. As pessoas ainda pensam na gente como o Jackson 5, de todo modo.
B&S: E você gostaria de ver Jermaine de volta ao grupo?
MJ: Sim, muito! Eu realmente gostaria - seria maravilhoso.
B&S: Há momentos na sua vida onde você gostaria de ser um anônimo e não o Michael Jackson?
MJ: Isto é verdade, há momentos em que eu desejo ser como todo mundo. Por exemplo, tem apenas dois lugares onde eu posso sair pra fazer compras - Nova York e Londres. E algumas vezes eles fecham a loja só para que eu possa fazer compras. Diana faz isto o tempo todo - eles fecham o shopping center inteiro pra ela!
B&S: Eu acredito ser necessário por motivos de segurança.
MJ: Sim - mas há momentos onde eu queria não ser tão facilmente reconhecido para poder sair e me divertir. Como poder ir me divertir nos brinquedos da Disneylândia!
B&S: Há algum plano definido de filme para você no momento?
MJ: Meu quarto está lotado de roteiros e eu ainda não tive o tempo de lê-los. Por ora, o que eu preciso é de umas férias.
B&S: Para onde você iria?
MJ: Ou Miami ou a Suíça. Eu amo Miami e eu amo a natureza da Suíça. Ela te deixa sem fôlego - as montanhas e os vales são tão bonitos, é como um país de histórias de livros e cada lugar é como uma foto de cartão postal. Eu prometi a mim mesmo que um dia eu seria dono de uma casa na Suíça e é uma promessa que eu quero manter.
B&S: Você gosta do clima e você sente falta por não ter mudança de estações na Califórnia?
MJ: Eu sinto muita falta por não termos mudança de estações, sim.
B&S: Você tem algum hobbie - eu sei que você gosta de ler.
MJ: Não há palavras para descrever como eu me sinto em relação à leitura. Eu apenas queria poder gastar mais tempo lendo porque é algo que eu amo muito. Eu consigo me perder em um livro de modo que eu me esqueço quem eu sou e o que está ao meu redor e onde estou.
B&S: É uma busca constante por sabedoria ou você também lê romances?
MJ: Ambos - mas eu amo ler a verdade! Filosofia é o meu tema predileto, todavia.
B&S: Você acha que chegará um dia a um ponto de auto-satisfação?
MJ: Oh, não! O que há de grande na leitura é que pode haver algo que você sente ou quer dizer e você acaba encontrando em uma frase de um livro. Às vezes você pode ler algo que tentou resolver a vida inteira em uma frase de um livro.
B&S: Você consegue visualizar um momento da sua vida onde você vai querer se aposentar da carreira de entertainer?
MJ: Eu acho que não. Eu gostaria de progredir constantemente. Como eu disse, eu gostaria de me envolver em cinema e eu gostaria de dirigir e fazer trilhas-sonoras, por exemplo. Esta é a minha meta principal para o futuro. Minha melhor experiência até o momento foi fazer The Wiz - eu nunca vou esquecer aquilo! Eu me perco em tudo isto.
Eu sou realmente sério e sincero em relação a cinema. O que eu amo nos filmes é que eles captam momentos que nunca se perdem e dos quais podemos apreender algo constantemente. Existiram tantos grandes entertainers que eu nunca pude ver e que foram perdidos para o mundo, consequentemente. Por exemplo, o que quer que façamos em um palco é apenas para as pessoas da platéia naquele determinado momento - e as multidões de pessoas que não estão lá? Mas se você capta isto em filme, é eterno. Como exemplo, eu pude aprender tanto assistindo Charlie Chaplin.
B&S: Você diria que 1979 foi o seu ano mais satisfatório até agora?
MJ: Eu estou muito orgulhoso de como progredi em 1979 em tantas áreas diferentes. Mas principalmente pelo sucesso do álbum Destiny. Nós mostramos ao mundo que podíamos fazer sozinhos e isso significou o começo do nosso próprio destino. Quebrou o gelo para nós como produtores, também.
B&S: É o que tornou Destiny um nome tão bom para o álbum.
MJ: É simbólico, você está certo. A canção é na verdade sobre mim e tem um significado muito, muito profundo pra nós. Mas ele também indicou uma nova direção para o futuro e estamos pensando em chamar o próximo álbum de Foundation - embora não estejamos certos sobre isto agora.
B&S: Você tem uma mensagem de despedida para seus milhões de fãs pelo mundo?
MJ: Eu gostaria de agradecê-los porque se não fosse por eles eu não estaria fazendo o que faço. E eu agradeço a eles por me aceitarem e pelo seu apoio. E que se eles não ouvirem de mim por um tempo (em entrevistas), é como eu expliquei anteriormente. Eu estou interessado apenas na verdade!