quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Diferente de Qualquer Outro, Inclusive de Si Mesmo (People, Setembro 1987)

People Magazine, 14 de setembro de 1987.

O empresário dele diz que ele é parte Howard Hughes, parte E.T., mas Michael Jackson vai além de descrições

Por um lado, é dito que Michael Jackson teria pedido Elizabeth Taylor em casamento (e construído um santuário para ela em sua mansão em Encino, Califórnia), que ofereceu $1 milhão pelos ossos do Homem Elefante, tomado hormônios para manter sua voz aguda e pouca barba, alterado cirurgicamente seus olhos, lábios, nariz e queixo, e passado a dormir em uma câmara hiperbárica de oxigênio na esperança de viver até os 150 anos.

Por outro lado, diz seu produtor e amigo de longa data, Quincy Jones, "Michael Jackson está concentrado e conectado com sua alma criativa. E ele é uma das pessoas mais normais que já conheci."

Ou Jones anda com caras extremamente estranhos, ou há algo mais em Michael Jackson que não encontra os olhos dos leitores de tablóides. Com isto em mente, a People tenta responder a maior pergunta do pop: Michael é estranho ou não?

Você não conseguirá a resposta de Michael, que deu sua última longa entrevista para a revista Ebony, em 1984. Sua última grande declaração pública, em uma conferência de imprensa em 1986 anunciando seu contrato de mais de $10 milhões com a Pepsi, consistiu, ao todo, nas palavras: "Esta é uma grande honra. Obrigado, sr. Enrico e aos associados da Pepsi. Senhoras e senhores, obrigado." Ele ainda não deu nenhuma entrevista, apesar do lançamento de seu novo álbum, Bad, o primeiro solo desde Thriller de 1982, que vendeu mais cópias (38.5 milhões e ainda vendendo) do que qualquer outro disco na história. Os críticos, no entanto, estão falando sobre Bad, e da maior parte estão falando bem. "Trabalho de primeira classe," disse o New York Daily News. "O maior disco para se mexer os pés desde Thriller," disse o U.S.A. Today. "Não vai machucar sua reputação," disse o Washington Post. Mesmo assim, nem todas as notas têm sido positivas, e a maioria dos críticos sugerem que, com toda sua brilhante competência técnica, Bad não irá chacoalhar o mundo do modo que seu predecessor fez. "Você não pode esperar que este álbum se saia melhor do que Thriller," diz o crítico do Los Angeles Times, Dennis Hurt. "É uma vergonha que mesmo que ele venda nove milhões de cópias, ainda será considerado um fracasso." Frank Dileo, o empresário, protetor, amigo e porta-voz de Jackson, não parece preocupado. "Todo mundo meio que se pergunta que tipo de pressão Michael sentiu," ele diz. "A resposta é simples: nenhuma. A atitude era de seguir em frente, fazer o melhor álbum que pudesse, e apresentá-lo. Eu acho que fizemos isso." Em relação à lacuna de cinco anos entre LPs, Dileo aponta que Jackson estava ocupado com outros projetos, incluindo Captain EO, um filme 3-D de fantasia, de 17 minutos e $40 milhões, apresentado na Disneylândia e no Walt Disney World; um ainda não-exibido comercial para a Pepsi; um clipe para o single Bad; um video de uma hora de duração, a ser televisionado em 1988, baseado na canção Smooth Criminal; e um video sobre o making of do video de Smooth Criminal.

Okay, okay, chega de negócios: vamos ao que importa. Michael pediu a mão de Liz Taylor em casamento ou não? "Não, ele não pediu," disse Dileo. "E não, não tem santuário pra ela na casa dele. Sim, eles são muito bons amigos. Eles jantam juntos ocasionalmente e se visitam." Injeções hormonais? "Ridículo," diz Dileo. Cirurgia nos olhos? "Ele nunca fez nada nos olhos". O nariz, Frank, o nariz? "Sim, ele operou o nariz, como toda pessoa em Hollywood operou. Elvis operou. Monroe operou." Maçãs do rosto? "Não." Ele botou um furinho no queixo? "Sim, há um ano atrás." Por que? "Ele queria um." Cirurgia química para clarear a pele? "Absurdo." A câmara hiperbárica de oxigênio? "Ele tem uma. Mas eu não sei se ele dorme nela. Eu não ligo. Mas Michael pensa que é algo provavelmente saudável para ele. Ele é meio que obcecado por sua saúde." Ele atendeu à estréia de Captain EO na Disney vestido de enfermeira? Sim e não. Ele estava lá, disse Frank, "mas eu não tenho certeza de que fantasia ele usava. Ele tem muitas." Ele deixou as Testemunhas de Jeová? "Sim." E sobre a história dele querer comprar os restos mortais do Homem Elefante do Centro Médico de Londres? "Bem, todo mundo tem um esqueleto em seu armário," diz Dileo. Mas em tom sério, ele acrescenta, "[Michael] ficou fascinado com o filme e realmente queria o esqueleto. Eu não sei o que ele faria com isto. Mas eu sei que ele teria colocado na sala enquanto tivéssemos uma reunião.”

E como funciona o dia do recluso cantor? "Começa por cerca das 9h30 e ele vai dormir por volta de 1 ou 2 da manhã," diz Dileo. "Ele toma café e às vezes lê o jornal e faz quaisquer ligações que ele tem de fazer." [Sobre ler o jornal - ele está suficientemente em contato com os acontecimentos atuais para identificar, digamos, Oliver North? "Talvez," diz Dileo.] Em seguida vêm os projetos do dia: trabalhar em um clipe, gravar no seu estúdio caseiro ou ensaiar para sua turnê mundial, que abre em Tokyo em 12 de setembro e chega aos Estados Unidos em fevereiro. É a primeira turnê solo dele.

Michael ainda vive com seus pais, Joe e Katherine, e a irmã LaToya na mansão de 22 quartos que ocupa um acre no subúrio de Encino, em Los Angeles, que a família comprou no final dos anos 70. Para relaxar, ele pode assistir a um filme no cinema de 35 assentos, pedir um lanche vegetariano pro seu chef particular ou brincar com seus bichos de estimação - Louie, a lhama, Jabbar a girafa, Thriller o cavalo árabe, um leão sem nome, duas serpentes píton birmanesas de 60 metros e uma seleção de papagaios (Por motivos de espaço, algumas das criaturas vivem com o treinador Bob Dunn.) O animal favorito de Jackson - e provavelmente seu companheiro mais próximo de qualquer espécie - é um chimpanzé chamado Bubbles, que foi treinado para sorrir, andar de skate, andar a cavalo, fazer o moonwalk e cumprimentar as pessoas. "Michael tem uma relação especial com Bubbles," diz Dunn. "Ele o mima, como qualquer pai faria. Mas ele é rígido com Bubbles quando necessário." Dunn não vê nada de extraordinário na paixão de Michael por animais. "Ele gosta de coisas que muitas crianças gostam, é claro. Quem não gosta? Digo, se nós todos pudéssemos tê-los, nós teríamos."

Há, claramente, um aspecto ingênuo em Michael. Animais, pregar peças (particularmente botando uma tarântula na manga das pessoas ou escondendo uma cobra nas sacolas da lavanderia) e colecionar materiais da Disney não são os passatempos principais dos maiores astros do rock de 29 anos. Jackson também tem uma afinidade especial por crianças: um vizinho de 10 anos chamado Johnathan foi visitante freqüente do set de Captain EO, e Sean Lennon e o astro do seriado Webster, Emmanuel Lewis, também são amigos. "Quando ele vem na minha casa, minhas filhas acham que fazem um grande favor me emprestando ele para que ele possa ensaiar," diz Quincy Jones. "Ele tem um um entusiasmo muito puro por coisas simples." Dileo e outros se apóiam na Teoria da Diversão Perdida, que postula que Jackson, que se apresenta desde os 5 anos de idade, está "fazendo agora as coisas que não podia fazer então."

Mas se Michael é uma criança numa doceria, ele também sabe quem é o dono da loja: Michael Jackson. Ele fez difíceis, e aparentemente grandes decisões em sua carreira: contratar Jones para produzir seus discos, trocar seu antigo empresário - seu pai - por Dileo em 1984, e gastar $47.5 milhões para comprar a ATV, que é proprietária dos direitos da maioria das músicas dos Beatles. Um insider diz que a transação provavelmente se pagará em dez anos e trará $5 milhões por ano para Jackson. Ele tem, segundo foi noticiado, o melhor contrato de royalties da indústria - $1.70 por álbum vendido, mais as taxas por composição - e parece ter ganhado o respeito das pessoas com quem trabalha. "Se algo não lhe agrada ele apenas diz, 'Vamos fazer novamente,'" diz Bob Collins, que dirigiu o making of do video Smooth Criminal. "Ele não ataca as pessoas que estão trabalhando. Ele tenta conseguir as melhores pessoas que pode e ele trabalha até atingir a excelência." O tecladista David Palch, que tocou em três faixas de Bad, disse que as críticas no estúdio "sempre foram positivas. Quincy e Michael não dizem nada, porque eles sabem que você está procurando algo que eles não entendem. É uma boa atitude a se ter." Acrescenta o tecladista Steve Porcaro, outro músico de Bad: "Michael tem idéias melódicas fortes e às vezes vem com coisas que eu nunca pensaria em um milhão de anos."

Jackson tem um surpreendente círculo de celebridades adultas amigas. Junto com Liz Taylor, "Gregory Peck tem sido seu amigo por 10 ou 11 anos," diz Dileo. "Sophia Loren é uma amiga; ela pediu a ele que a levasse ao American Cinema Awards no começo deste ano. Ele é amigo de Spanky Macfarland [da série de filmes Our Gang]. Marlon Brando é um amigo muito próximo. Eu estou na maioria dos jantares e não há nada de fora-do-mundo que eles discutam. Eles conversam sobre a vida, sobre fazer filmes, como as coisas são feitas." Cary Grant era um amigo, e Michael acompanhou Liza Minnelli ao funeral de seu pai em 1988. "Brando nos convidou para sua ilha três ou quatro vezes," acrescenta Dileo. "Nós íamos com Scorcese e De Niro, mas sempre tínhamos muito trabalho." Suspeita-se que um álbum de conversas entre Michael Jackson e Marlon Brando possa bater até as vendas de Thriller.

Significantemente, quase todo mundo que passa um tempo com Jackson, invariavelmente usa a mesma palavra de nove letras para descrevê-lo: "simpático." Ele pode ser excêntrico; ele não é, pela maioria dos relatos, egocêntrico. "Eu não vi nada de estranho," diz Helene Philips, coreógrafa assistente em Captain EO. "Não tinha um grande ego. Ele foi amigável e se divertiu. Eu sentava no colo dele para discutir as cenas."

Gene Shelton, relações públicas de Jackson para o álbum Off The Wall de 1979, relembra-se que Michael tinha hábitos peculiares - como deixar sua irmã Janet falar por ele em conferências de imprensa - mas "nunca foi desrespeitoso. Ele sempre dizia 'obrigado'. Não tenho nenhuma história de terror para contar sobre como ele tratava as pessoas." "Sempre rindo e brincando," diz Ola Ray, a atriz do video de Thriller. "Ele parecia muito feliz."

O trabalho de Jackson para caridade também é notável. Entre outras contribuições, ele doou $1.5 milhão para criar uma unidade médica, o Michael Jackson Burn Center para vítimas de queimaduras, em L.A. Ele doa regularmente para a pesquisa contra a leucemia e para um acampamento voltado para crianças com doenças terminais, e desde 1985 patrocinou 97 bolsas pelo fundo da universidade United Nego.

Diz a crítica do L.A. Times, Hunt, que entrevistou Jackson em 1982: "Ele é tímido e excêntrico, mas é sincero. Não dá pra dizer algo de ruim sobre ele."

Resume Dileo: "Ele é profundamente devotado e disciplinado. Parece tedioso e estúpido, como se eu estivesse escondendo alguma coisa, mas não estou. Ele sabe que é uma boa pessoa. Eu espero que ele seja visto como um bom entertainer, já que é isto que ele gosta de fazer."

Oh, e mais uma coisa. Acrescenta Dileo, com apenas uma pitada de ironia: "Nós vemos nós mesmos como apenas dois caras normais.”

Traduzido por Bruno Couto Pórpora.