domingo, 8 de julho de 2012

O Homem de $41 Milhões de Dólares (Beat Magazine, Junho 1995)

Beat Magazine, Junho 1995
Por Nick S. Marvin e Christie Eliezer

Histeria ou a HIStória sendo feita? Poderá o álbum mais caro já feito e promovido reacender a carreira de Michael Jackson e vender mais que Thriller?

Neste mundo efêmero de heróis descartáveis e superastros temporários, Michael Jackson é sem sombra de dúvida um ícone de longevidade. Ele é talentoso, criativo e trabalhador mas, acima de tudo, bancável. Na pior hipótese, seus álbuns são bem sucedidos, vendendo algumas milhões de cópias; na melhor das hipóteses, ele cria uma obra-prima que redefine o reino do comércio varejista de música (como as 50 milhões de cópias vendidas de Thriller).

No palco, Jackson flutua. Ele desafia a gravidade e a maioria das outras leis da física ao se mover com furtiva precisão e, acima de tudo, graça.

No entanto, está sobre estes gentis ombros o império multi-milionário que ele criou para si mesmo. Mas manter o passo não é bom o suficiente para ele. Cada álbum desde Thriller tem sido percebido como uma tentativa, simplesmente porque deixou de vender tantas cópias quanto - ou mais.

E com o lançamento do seu novo álbum, a Sony Music está ligando a batida ao promover a máquina de entretenimento milionária que é Michael Jackson.

Esta não é uma fanfarra descabida que a gravadora decidiu promover. Muito está sendo apostado em HIStory. Se ele falhar, a Sony deve perder uma quantia extravagante de dinheiro.

Mas vender Michael Jackson não será tão fácil como foi há alguns anos atrás com álbuns como Thriller, ou até mesmo Dangerous. Até então, o único problema deles era um rapaz esquisito com uma estranha obsessão por animais.

Hoje, no entanto, Jackson - a entidade, é uma bagunça complicada, o pesadelo de um marqueteiro. As supostas inúmeras cirurgias plásticas, as alegações de embranquecimento de pele, a criança abusada que perdeu sua infância, o contrato multi-milionário da Pepsi que foi revogado, o chocante casamento com Liza Marie e, acima de tudo, as especulações de pedofilia. Todos esses aspectos não fazem deste um produto de marketing fácil.

E a Sony parece saber disso. "Nós passamos mais tempo planejando este álbum do que qualquer outro álbum na história da empresa," disse um executivo da gravadora nos Estados Unidos. O orçamento de marketing para HIStory está em $41 milhões. Não uma quantia pouca de dinheiro para a meta conservadora de apenas 20 milhões de cópias a serem vendidas.

Mas quem é Michael Jackson? Seus críticos o classificam como um confuso excêntrico e recluso que vive em um mundo criado por ele mesmo onde ele sozinho é o chefe. Estes que o conhecem, no entanto, dizem que ele é um gênio musical - uma lenda. Os poucos vislumbres que temos dele, seja pelo Oprah ou Molly, parecem orquestrados e pré-planejados onde os entrevistadores são eles mesmos celebridades cujos primeiros nomes precisam ser lembrados ao público para identificarmos. Desde fevereiro de 1983, quando Gerry Hirshey, um escritor da revista Rolling Stone, passou alguns dias com o astro, nada de razoável profundidade foi escrito ou filmado para o consumo do público.

E Michael Jackson mudou ao longo da última década. Então houve a primeira entrevista para quebrar gelo. Uma de duas. Desta vez não há Molly ou Oprah (embora Molly tenha uma entrevista marcada para o futuro), mas Diane Sawyer, predominantemente uma jornalista de notícias. Falando sobre a entrevista, ela diz: "Eu não sei que tom as perguntas tomarão. Eu vou perguntar sobre assuntos chave? É claro. Ele está esperando isso? É por isso que ele resolveu dar a entrevista. Ele tomou esta decisão. Ele sabe bem que eu sou uma repórter investigativa."

O livro de 52 páginas que acompanha HIStory parece um livro de referências implorando por credibilidade ao astro. Primeiro tem Steven Spielberg que diz, "O Michael Jackson que eu tenho o prazer de conhecer há 13 anos é, sem afetações, e isto não é uma ilusão... Ele sente muito da responsabilidade que um pai sente - os filhos dele são todos os nossos filhos."

Então temos Elizabeth Taylor cantando suas glórias com sua característica eloquência, cheia de superlativos. "Eu acho que Michael é como uma folha em branco," ela diz. "Ele está sempre tentando aprender. Ele é muito esperto, ele é inteligente e ele é astuto - esta é uma palavra estranha para se usar em relação a ele, porque implica desvios e ele é uma das pessoas menos desviadas que eu já conheci na minha vida."

Finalmente, as palavras da falecida Jacqueline Kennedy Onassis, replicadas de sua introdução em Moonwalk: "Para muitas pessoas, Michael Jackson parece uma personalidade esquiva, mas para aqueles que trabalham com ele, ele não é. Este artista talentoso é um homem sensível, doce, engraçado e cheio de idéias."

O livro também possui fotos de Jackson com presidentes americanos, Nelson Mandela e Mick Jagger... e até beijando bebês.

Marcado para ser exibido nos Estados Unidos ao longo dos próximos dias, está um vídeo de quatro minutos filmado em Budapest com o Exército da Hungria - que custou $6.5 milhões.

Na Austrália os planos são tremendos. "A Austrália vai embarcar em uma das maiores campanhas de TV já vistas no país," lemos nos planos de marketing da Sony para Jackson. "Esperem grande cobertura em todas as publicações diárias. Também teremos competições estratégicas incorporando Jackson."

A campanha de televisão, como no passado, será encabeçada por Molly Meldrum. "Em 19 de junho, segunda-feira, Molly irá apresentar um especial de meia hora no horário nobre. Ele também anunciará um grande competição de Jackson em conjunto com a TV Week. O prêmio será ingressos para toda a família visitarem um local histórico."

E temos também outdoors, cartazes, janelas de lojas pintadas e a exibição de curta-metragens de Jackson no cinema e nas companhias aéreas.

E quanto ao álbum? Poucos jornalistas o viram, menos ainda o escutaram. Christie Eliezer da Beat já fez uma crítica de HIStory, e favoravelmente. Críticas dos Estados Unidos também são boas. No entanto, a revista Billboard diz que as lojas nos Estados Unidos ainda estão desinteressadas em pedir grande número de cópias.

O álbum venderá? É claro que sim. Todo este marketing deve ter algum efeito. Alguns comprarão simplesmente pelas músicas antigas. Jackson terá de produzir pelo menos dois ou três discos ruins antes de sua base de fãs fiéis parar de comprar seus produtos. Outros comprarão por pura curiosidade, e outros simplesmente para completar sua coleção de CDs de Jackson. Mas mais importante ainda, este será o primeiro álbum de Jackson que terá à sua disposição o acesso a todo o mercado asiático, não um, mas dois canais de música (24h no ar) feitos sob medida para videoclipes inovadores (que custam mais do que muitos filmes).

Atrás de toda essa histeria marqueteira: as entrevistas exclusivas, os clipes caros, festas de lançamento e brindes promocionais, está Michael Jackson. Além de ser um dos artistas que mais vendeu discos no mundo (100 milhões de álbuns nos últimos 15 anos), ele é um mestre empresarial capaz de negociar, associar e re-inventar - até a ele mesmo, se ele precisar.

Seu contrato de realeza com a Sony é um dos mais conhecidos; sua associação atual com grandes como Slash, Janet Jackson, Boys II Men e Shaquille O' Neal em HIStory não podem fazer nada além de bem para sua imagem e para o álbum; seu catálogo da ATV inclui as músicas dos Beatles; e o contrato multi-milionário com a LA Gear retrata um homem em completa posse de suas faculdades.

Até as acusações de abuso sexual do garoto de 13 anos, Jordan Chandler, foram bem cuidadas. Pagar $62 milhões em um acordo fora dos tribunais pode não ter dado a Jackson a chance de se vindicar, mas se você pensa na obsessão dos Estados Unidos com julgamentos de alta publicidade, especialmente se tratando de superastros negros, pode ter sido a opção mais esperta disponível. O.J. Simpson é um herói americano conhecido no mundo todo mais como um ator coadjuvante do que como um herói do futebol. Jackson, no entanto, é um ícone do rock internacional, um caso de abuso sexual contra ele teria feito o julgamento de O.J. parecer com o tribunal de pequenas causas.

O casamento Jackson-Presley chocou o mundo, que riu sarcasticamente das duas crianças com tempo demais em suas mãos. Em retrospectiva, no entanto (um ano pra ser exato) parece mais uma manobra estratégica do mestre. Ela não apenas tirou o foco do escândalo sexual, como unificou o império do Rei do Pop com o do Rei do Rock 'n' Roll, onde Neverland conhece Graceland.

Este homem de 36 anos pode dar ao mundo a impressão de que ele é uma espécie de esquisito que perdeu a sanidade, mas atrás da máscara está um astuto empresário, um gênio criativo, um sobrevivente e, acima de tudo, um consumado entertainer. Isto por si só já venderá milhões, a cada novo disco.



Traduzido por Bruno Couto Pórpora