sábado, 21 de maio de 2011

Não há Limites no Mundo de Fantasia de Michael Jackson (LA Times, Novembro 1991)

LA Times, 14 de novembro de 1991
Por Alan Citron e Daniel Serone

Às 4 da manhã no Halloween, as imponentes portas vermelhas do Bernie Grundman Mastering em Hollywood se abriram para revelar um homem trajado inteiramente de preto - incluindo uma máscara cirúrgica também preta. Não era um ladrão ou alguém querendo doces-ou-travessuras. A lenda do pop, Michael Jackson, havia chegado para supervisionar o trabalho final no seu muito aguardado álbum, Dangerous.

O perfeccionismo mítico de Jackson já havia atrasado o lançamento do álbum por muitos meses. Mais de 50 músicas foram gravadas nos estúdios de Los Angeles ao longo de um ano - alegadamente elevando o custo da produção para altíssimos US$8 ou US$10 milhões.

Agora, com as 14 músicas que Jackson selecionou finalmente em mãos, uma equipe de engenheiros de som trabalham contra o relógio para criarem um disco de sonoridade coesa.

Enquanto Jackson trabalhava na sala de controle com o produtor-engenheiro de som Bruce Swedien e Grundman, um grupo de funcionários da gravadora de Jackson, a Epic Records da Sony, estavam prontos para entregar em mãos cada uma das cópias master para oito plantas de produção ao redor do mundo. Uma cópia foi enviada para a Holanda. Outra para a Austrália. A terceira para Nova Jersey. Até um jato corporativo da Sony integrou a frota de transporte de Dangerous.

Isso é um caminho longo comparado a um Sedex, mas extremos são a norma no mundo maior do que a vida de Michael Jackson, que quebrou todos os batentes para reafirmar seu status de Deus do pop reinante com Dangerous.

"Eu estou um pouco preocupado agora. Como qualquer outra coisa pode ser comparada a essa histeria?" se perguntou o diretor John Landis, que dirigiu o mais novo videoclipe de Jackson, Black Or White, assim como o pioneiro Thriller de 1983. "É como a Segunda Vinda". "Você está lidando com o artista mais importante do mundo," disse David Geffen, o magnata da indústria fonográfica e um conselheiro informal de Jackson. "Tudo o que Michael faz é acompanhado de muito pensamento e energia. Ele é um perfeccionista."

O frenesi multimídia começou há várias semanas atrás, com a exibição de um comercial de estilo surreal filmado pelo cineasta David Lynch e o lançamento na semana passada do primeiro single, Black or White. Continua hoje à noite com o lançamento mundial do videoclipe de Black or White, um espetáculo de 11 minutos com efeitos especiais state-of-the-art. O clipe de US$4 milhões - o qual o pessoal da Sony e da equipe de Jackson prefere chamar de curta-metragem - estará disponível para 280 milhões de lares em 69 países ao longo do dia.

O álbum chega no dia 26 de novembro, no momento certo para a temporada de compras natalinas. Os varejistas estão contando com Jackson para ajudar a despertar a indústria de seu recente sono de vendas. Para a Sony, as apostas são muito mais elevadas: Dangerous é o primeiro filho de seu novo e gigantesco negócio com Jackson, que abrange tudo, desde filmes a video games. Praticamente todo mundo espera que o disco venda bem. Mas para ser comparável aos alto padrões de Jackson, ele deve vender entre as 25 milhões de cópias de seu disco de 1987, Bad, e as recordes 48 milhões de cópias de Thriller.

E a batida continua. Mais de 400 membros de equipe estarão disponíveis em um hangar no Aeroporto de Santa Monica na sexta-feira, quando Jackson grava sua performance para o especial de 10 anos da MTV, previsto para ir ao ar na ABC em 27 de novembro. Isso é 10 vezes mais do que o número comum de membros, dizem pessoas da tripulação.

Aqueles que escutaram Dangerous insistem que os fãs do recluso artista de 33 anos não ficarão decepcionados. Embora o disco esteja cheio dos uivos e ritmos dançantes clássicos de Jackson, também inclui toques contemporâneos como rap e sampling. Os devotos de Jackson o descrevem como "grande" ou "mágico" - duas palavras que parecem descrever bem a vida de Jackson.

A lendária obsessão do cantor em superar a si mesmo estava plenamente aflorada durante a gravação do álbum, de acordo com as pessoas envolvidas no projeto. Mais de 50 músicas foram gravadas, re-gravadas e a maioria delas descartadas. Quatro estúdios de gravação ao custo de US$30.000 por dia estavam ocupados pela equipe de Dangerous no auge do projeto.

Um atraso foi causado porque Jackson serviu como anfitrião e padrinho no recente casamento de Elizabeth Taylor. Jackson também teve de lidar com a má publicidade gerada pelo recém lançado livro de sua irmã, LaToya, e por uma canção de seu irmão, Jermaine, em que ele critica suas cirurgias plásticas.

Fontes dizem que as fitas master de Jackson chegaram quase sem tempo nenhum de sobra, dado o número de dias que se leva para fazer os CDs, cassetes e LPs, e entregá-los às lojas de todo o mundo. Apesar disso, Jackson insistiu que prestassem total atenção aos detalhes, disse o engenheiro de som Grundman. Os engenheiros fizeram a mão a extraordinária quantidade de 16 masters de primeira-geração de Dangerous, a fim de garantir que a melhor qualidade de som possível fosse alcançada ao chegar na prensa de discos. Sony, a gigante japonesa de eletrônicos que assinou com Jackson um novo contrato em março, nunca pressionou o cantor para uma data de entrega específica para o álbum Dangerous - embora tivessem esperado, em um dado momento, que o álbum fosse lançado no verão.

"Nenhum álbum de superastro deve sair em uma data determinada," disse uma fonte. "Caras como Jackson trabalham em seu próprio ritmo."

Os executivos da Sony apenas esperam que todo o seu esforço seja recompensado. O contrato de multimídia dá a Jackson autonomia virtual sobre suas atividades, assim como uma parcela extraordinária dos lucros.

Um associado descreveu Jackson como "exausto" após "trabalhar ininterruptamente" para completar o disco e o videoclipe em tempo para a campanha publicitária multimilionária da Sony. No entanto, espera-se no próximo ano que o frágil Jackson esteja em constante movimento para apoiar Dangerous, com uma série de ambiciosos videoclipes para o restante das músicas do álbum e possivelmente uma turnê para rivalizar com os mega shows da Victory, de alguns anos atrás.

"Michael é show business grande, e ele sempre fez tudo maior do que a vida, então ele não sabe como fazer de outra maneira," disse um diretor de videoclipes que pediu para não ser identificado. "Tudo é feito à escala da turnê Victory. Tudo é enorme."

O frenesi em torno da estréia de Black Or White, que inclui participações do astro de Esqueceram de Mim, Macaulay Culkin, e o onipresente Bart Simpson, podem estabelecer um novo padrão para campanha publicitária de videoclipe. Mas enterrado abaixo da publicidade estão os relatos de que o projeto ambicioso enfrentou problemas decorrentes principalmente da busca de Jackson por um entretenimento colossal.

O alto custo da re-filmagem de sequências de danças inchou o orçamento para acima dos US$4 milhões e levou a uma finalização que quase coincidiu com a data de estréia.

Na segunda-feira à noite, a Propaganda Films ainda estava aparando e editando a versão final de Black Or White. Naquele momento, nem a Fox, nem a MTV, nem a Black Entertainment Television haviam assistido ao espetáculo que eles prometiam aos telespectadores há semanas.

As complicações parecem ter ligação com a luta de Jackson pela teatralidade. Quando Jackson queria dançar com uma parceira no meio de uma rodovia movimentada, uma rodovia foi re-criada em Sun Valley, e 50 motoristas dublês foram contratados para garantir a segurança do casal.

Alguns números de dança exóticos foram refilmados em locação depois que Jackson decidiu que eles não eram espetaculares o suficiente. Um elaborado cenário da Praça Vermelha foi construído em um lote do Culver Studios para a sequência de dança dos cossacos russos, e 50 cavalos foram usados na sequência de dança indiana americana - aparentemente o ponto alto do clipe - em Vasquez Rocks, perto de Saugus.

Quando Jackson decidiu se transformar em uma pantera negra para o clipe, ele largou a ultrapassada prótese que o havia transformado magicamente em lobisomem no video de Thriller, optando por seguir com a última moda dos efeitos especiais gerados por computador. A tecnologia meticulosa, chamada de "morphing", porque um objeto parece perfeitamente metamorfosear em outro, foi usada para animação no filme Exterminador do Futuro 2.

Um recorde de 15 transformações de uma pessoa que se funde em outras - uma mulher pálida, com cabelos cor de fogo que se transforma em um rastafari com dreadlocks, que muda para uma mulher indiana com uma marca de casta na testa. Cada pessoa, por sua vez, canta e dança.

"Nós fomos mais longe com isto do que jamais foi feito antes," disse Jamie Dixon, o supervisor de efeitos especiais para a Pacific Data Images em Los Angeles. "Michael queria colocar quase tudo do universo inteiro nesta coisa."

Jackson permaneceu fiel à sua reputação lendária de sigilo durante as filmagens de Black Or White. Quando curiosos tentavam olhar de um prédio mais alto, um painel foi colocado em um ângulo que garantisse completa privacidade. Às vezes, quando ele conversava com Landis no set, um observador disse que Jackson levantava uma capa escura que usava e os dois discutiam por trás dela. A locação teria sido cercada por cortinas pretas de 12 x 12 metros para manter o local alheio à cidade - e Jackson também - quando o astro desenvolveu uma gripe.

O repórter da TV Guide, Stephen Galloway, descreveu a cena surreal na noite em que visitou o set em Los Angeles: "Isso foi no centro da cidade, em Skid Row, com dois drogados dormindo na calçada. Então eu cheguei lá e foi como se eu fosse ver o presidente. Uma limusine branca se abre e de repente, do nada, surgem meia dúzia de seguranças dos lados dela. Eu estava atrás do carro e vi esta meia vermelha descer em direção ao chão e um cara (Jackson) com essa máscara enorme no rosto atravessando rapidamente os cinco metros necessários para chegar ao seu trailer."

Galloway foi permitido no set somente após longas negociações e de vários adiamentos. No dia após a sua visita, Jackson enviou a Galloway uma dúzia de copos de cristal Baccarat da Tiffany, que Galloway estima valerem US$1.000. Galloway enviou o presente de volta.



Traduzido por Bruno Couto Pórpora