People, 17 de outubro de 1983
Por Roger Woulmuth
Em produção se parece com qualquer outro grande negócio de Hollywood: muito dinheiro, muitas estrelas, um diretor que já venceu prêmios, e uma trama envolta em segredo. Todavia, para o diretor Bob Giraldi, o movimentado mês passado, de vôos e ligações para Londres e região costeira, não vai terminar em um filme arrasa-quarteirões. Os prêmios de Giraldi, afinal de contas, foram Clios, e não Oscars, ganhos por seus comerciais de TV para Miller Lite e McDonald’s. E, na semana passada, quando ele voltou suas câmeras para Michael Jackson e Paul McCartney, seu objetivo não era Cinerama, mas minirama: um vídeo-clipe de comédia, de cinco minutos, feito para mega-promover o single dueto Say, Say, Say.
Tais vídeos se tornaram a mais quente nova forma de arte – e um requisito para o rock’n’roll – graças à MTV, o canal de televisão de música que agora transmite 300 tais clipes por dia para 15 milhões de lares com TV a cabo. Na semana passada, 17 dos 20 álbuns mais vendidos na Billboard foram representados nas telas domésticas por meio de mini-filmes mostrando roqueiros em concerto ou cantando em playback em vinhetas bizarras.
Os clipes, fornecidos de graça pelas gravadoras, são tanto propaganda quanto arte, é claro, e também são caros. O vídeo de cinco minutos de Billie Jean, de Michael Jackson, que ilustra o cantor como um amante de becos de piso iluminado a caminho de um encontro marcado, custou mais de $75,000 para ser produzido. O vídeo de Beat It, dirigido por Giraldi, que mostra Jackson como um Príncipe da Paz de ruas violentas, empregou o co-coreógrafo das Dreamgirls, Michael Peters, 14 dançarinos e duas genuínas gangues de rua, totalizando uma conta em torno de $150,000.
Pode ser o melhor dinheiro que Michael Jackson e sua companhia, CBS/Epic, jamais gastaram. (Michael ficou com os custos de Beat It; a CBS pagou por Billie Jean.) Repetido quase à saturação na MTV, os dois vídeos ajudaram a empurrar as vendas do álbum Thriller para além da marca dos 10 milhões somente nos Estados Unidos – ou cerca de $50 milhões em faturamento bruto. Ainda vendendo na taxa de 200,000 cópias por semana, 10 meses completos após seu lançamento, Thriller é o álbum mais vendido da história da CBS.
Jackson, entretanto, é somente o mais espetacular beneficiário da explosão do vídeo. De modo geral, este se tornou um tônico milagroso para uma indústria aflita por uma crise de quatro anos e um declínio de 40 por cento (entre 1979 e 1982) em vendas. Lançada há dois anos atrás pela Warner Comunicações e a American Express Company, a MTV, com suas 24 horas diárias de rock, tomou o lugar do rádio na preferência de muitos de seus espectadores, estes em maioria menores de 35 anos. O canal a cabo, que vem agregando pelo menos meio milhão de assinantes por mês, “nos deu um fenomenal novo modo de expormos música e mudou a indústria fonográfica dramaticamente,” diz Bob Krasnow, presidente do conselho da Elektra/Asylum. Jim Mazza, presidente da Capitol e EMI Records, adiciona: “se não fosse pela MTV, a indústria da música ainda estaria em crise.”
Os outros grandes vencedores deste vídeo game tão desafiante tem sido novos grupos de rock lutando por exposição. Quando Duran Duran, o agora popular quinteto britânico, lançou seu primeiro álbum nos EUA em 1981, o LP não foi a lugar algum. Então o grupo gravou Rio, seu segundo álbum, e voou para o Sri Lanka para gravar um vídeo clip a acompanhar seu single Hungry Like the Wolf. A aventura nas selvas, com direito a um breve duelo com uma garota nativa pouco vestida, provou-se um sucesso na MTV, e o Duran Duran assistiu a Rio escalar firmemente até o No. 14 e Wolf até o No. 3 das paradas. No ano passado, durante sua turnê pelos EUA, os membros do Duran Duran encontraram-se cercados por 5000 fãs em Nova Iorque – não em uma estação de rádio ou em uma loja de discos, mas na Manhattan Radio Shack que estava vendendo a fita do Hungry.
Enquanto estações de rádio prendiam-se a fãs incondicionais de rock antigo, novos grupos como os Fixx, Eurythmics, Flock of Seagulls, Def Leppard e U2 voltaram-se à MTV para encontrar seus jovens seguidores. The Stray Cats, o trio de rockabilly de Long Island, prosperou na Europa e em estações de faculdade também nos EUA, mas não conseguiram quebrar as rígidas listas de reproduções em estações comerciais. Então a MTV começou a levar ao ar o vídeo de Stray Cat Strut, um filme de fantasia no qual o grupo se apresenta em um beco sujo enquanto uma irada vendedora de peixes dá-lhes um banho de lixo. De repente o trio “começou a vender em Seattle, muito embora não tívéssemos qualquer estação de rádio tocando o grupo”, lembra Jim Mazza, da Capitol. “Os pedidos começaram a chegar. Bem, a MTV entrou no mercado de Seattle, e as pessoas estavam saindo e comprando álbuns como loucas.”
Grupos de rock e companhias de gravação não foram as únicas a capitalizarem nos músculos da MTV. Enquanto lançavam o filme Flashdance em Nova Iorque no ano passado, os produtores Don Simpson e Jerry Bruckheimer viram o canal pela primeira vez (ainda não estava disponível em Los Angeles). Mais tarde eles transformaram três dos números de música e dança do filme em vídeo e os lançaram na MTV para coincidir com o lançamento de Flashdance. O filme, é claro, se tornou o hit surpresa do verão, acumulando $86 milhões em setembro. “A MTV foi extensamente importante para o sucesso do filme,” diz Simpson. “Há uma correlação de igual para igual entre onde a MTV é quente e onde Flashdance é quente.” Para não deixar passar algo de bom, os produtores de Staying Alive adotaram a mesma tática com a canção hit deste filme, Far From Over.
Dos 20 ou 25 novos vídeos que chegam à MTV a cada semana, algo em torno de 95 por cento adapta-se ao formato todo rock do canal e acham seu caminho até a transmissão. Para manter equilíbrio entre metal pesado, syntho-pop, rockabilly e o restante das subespécies de rock, a estação faz pesquisas regulares com seus espectadores, lojas de discos, clubes de dança e estações de rádio, tendo os resultados tabulados por um computador. Tal programação por números resultou em uma lista de estrelas de maioria branca, e mesmo Michael Jackson teve dificuldades em encontrar espaço. “No começo eles não sabiam o que seria aceitável para sua audiência”, nota o vice-presidente da CBS Records, Frank Dileo, dizendo que voltou na estação “diversas vezes” para discutir em favor da inclusão de Jackson. Les Garland, vice-presidente da MTV e responsável por sua programação, diz que a questão é de “rockismo”, não de racismo. “Você não pode ser todas as coisas para todas as pessoas. Não pode tocar jazz, música country e funk. Você perde seu foco.”
Alguns vídeos de rock foram rejeitados pela MTV por razões além da música. As brincadeiras ousadas de David Bowie em China Girl foram mandadas de volta para pesada edição, e outros clipes foram descartados por completo. Entre eles, Oh, Pretty Woman, de Van Halen, mostrava pigmeus perseguindo um travesti, e Neighbours, dos Rolling Stones, sugeria mutilação e assassinato. “Censura não é uma palavra que gostamos de usar por aqui”, admite Garland, um dos três homens do “comitê de revisão” da estação. “Nós chamamos de bom julgamento.”
Bons negócios talvez façam mais justiça. Os clipes chegaram a canais e programas de todos os tipos, desde Friday Night Videos, da NBC, até Night Tracks, da Turner Broadcasting, ou Video Jukebox, da HBO, entre outros. Contratos também estão mudando para acomodar o formato. “Antes, fazíamos acordos de gravação”, diz Bob Krasnow, da Elektra. “Agora fazemos acordos áudio-visuais. No ano que vem, faremos um, provavelmente dois vídeos por álbum pop ou black que lançarmos.
Em muitos casos, dinheiro que antes ia para turnês agora vai para vídeos, que começam em cerca de $35,000. “A idéia nos anos 70 era levar a ação para a estrada, no caminho de cidade para cidade”, diz Al Teller, gerente geral da Columbia Records. “Mas mesmo sob a melhor das circunstâncias, o número de pessoas que seria alcançado era uma fração do que você pode alcançar através da MTV em um período de tempo mais curto.”
Não foi o fluxo de caixa, todavia, mas uma nova e criativa tomada que atraiu muitos diretores para o gênero. “A princípio eu pensei que este é um ótimo lugar para novos diretores começarem,” observa Tobe (Poltergeist) Hooper, que recentemente se juntou ao roqueiro Billy Idol. “Então eu pensei, ‘Puxa, este é um grande lugar para se fazer um filme de três minutos, para fazer dele um campo experimental.’ ” Brian Grant, um veterano de cerca de 175 produções, incluindo Physical, de Oliva Newton-John e She Works Hard for the Money, de Donna Summer, diz: “É realmente um laboratório. Suas costas estão contra o muro o tempo todo. Você está sempre lutando contra o tempo e o dinheiro, e aprende muito.” Bob Giraldi, que trabalhou com Diana Ross e Pat Benatar, assim como Michael Jackson, é entusiástico: “Não há limitações artísticas na MTV, somente limitações de orçamento.”
Algumas vezes nem mesmo estas importam. Há rumores de que Michael Jackson esteja planejando um vídeo de 10 minutos para a faixa-título do álbum Thriller. Seu custo projetado, de acordo com um relato: gritantes $500,000. E Steve Nicks, depois de gravar um elaborado drama temático da Guerra Civil para ser lançado junto com Stand Back, jogou o trabalho final no lixo porque achou que ela ficou muito gorda em algumas cenas. Quanto custou a vaidade? No caso de Nicks, cerca de $85,000.
Ainda assim, dada a multiplicadora importância do vídeo, talvez um pouco de vaidade faça sentido. Com a TV a cabo prevista para estrear na Inglaterra no ano que vem, a MTV agora se juntou a um consórcio em procura de um segundo canal de televisão no estrangeiro. Um competidor é um grupo co-dirigido pelo empresário Beatle, Ringo Starr. Enquanto isso, video bars e discotecas estão aparecendo pelos EUA, e em torno de 500 cinemas logo começarão a mostrar concertos de mini-vídeos antes de seus filmes. Video 45s (custando cerca de $20 por três músicas) e álbuns de uma hora de duração (por cerca de $60) já estão disponíveis para sistemas domésticos. Poderá toda esta vídeo-mania colocar entraves no apelo da MTV? De acordo com Les Garland, não. Ele nota, feliz, que mais de 60 por cento das TVs norte-americanas ainda não se ligaram ao cabo. “Do que depender de mim, não há teto”, diz. “Enquanto a TV a cabo se expandir, nós também podemos.”
Traduzido por Lucas Bucchile